segunda-feira, 28 de março de 2011

Trecho sem nome.

Chega à casa. Confere as sensações. Há um tremor no centro do peito. Se é medo, se é paixão, se é presença de sentimento alheio, não descobre. Deixa-se massagear por água fria. Veste-se com panos macios. Escolhe música amorosa. Escolhe vinho tinto, seco. Corta, recorta, lava, tosta, tempera, deixa em fogo. O tremor segue, qual obra de quebranto.

Querem saber de uma coisa? Vou contar. Vou sim. Esta personagem é esquisita. Parece existir qual espectro. Desenha-se, somente em traços, na imaginação do narrador. Brinca de ter perfil. Finge ter história, fundo, inconsciente oculto, impulsos e tons. Todavia nada diz. Pouco respira. Não se enfia na vida e, apesar, não morre. Treme em canto.

Música russa, taças e taças, risoto apimentado, meia luz e coisas outras, em lista exaustiva, comparecem à noite. Ao todo, no dentro e fora, dirige-se a atenção do sujeito, o oculto. Enfrenta-se. Ao contar-se busca pacificação. Medita o transitório, o finito, o sentido desconhecido do seguir em direção a qualquer parte. Teme o tremor. Teme perder o encanto.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Elipse.

Dias e seus volumes comparecem, em palavras, à página branca sobre o fundo azulado. O desejo de escrita, registro, existência além do momento, enche os fatos de sentido. O real afigura-se fantástico. O dia, claro e singelo, quer existir qual capítulo de grande história. Como chegar ao intento? Como atingir o invisível alvo?

Logo depois do terremoto, o grande, a personagem chega à janela. Incêndios próximos e distantes são as fontes da luz. Não há falas. Os olhos não se movem. Atentam ao edifício em obras, intacto. Em meio aos desmoronados apresenta-se em seus muitos patamares abertos. Resta feito memória de um momento perdido, de um futuro que não virá.

Como será o próximo instante? Sobre tanto nada se sabe. Perguntas e angústias sucedem-se em busca de entendimento. A fala quer desenhar uma trilha. A memória quer tornar-se um mapa. Entretanto, as imagens desaparecem, as lâmpadas apagam-se e o passado vira sonho. Às cerimônias do fim, ao que parece, faltarão os tempos.

quarta-feira, 16 de março de 2011

O caldeirão e o poço.

Moléculas, pedaços, ondas, coisas tantas misturadas, dissolvidas umas em outras, partes invisíveis de seres presentes fervem no caldeirão. Veio, o tudo, do poço. De profundezas, de desconhecido, de fim, de invisível todo, veio.

Acrescenta açúcar. Acrescenta sal. Acrescenta uma erva. Mexe. Pita umas pitadas. Volta ao poço, volta ao fundo. Funda um olhar infindo. Finda em rima funda. O mundo, em vezes, é imundo, é fosso. É isto. É lá no poço. É por lá o caminho, o veio.

Que mais? Dizer é pouco. O poço é muito. O caldeirão é parco. Treme o todo. Essências exalam perfumes. Essências manifestam. Verdades, dúvidas, troças, piadas espalham-se em curtas explosões. Tudo retorna ao fundo, ao donde veio, ao poço.

terça-feira, 8 de março de 2011

Pausa.

Graças à música é necessário pronunciar. Não fosse a dita haveria o intransponível. Qual corda, cinto, amarra, asa, trilho, rota, ar e etéreo está posto o som. Agarra-se o homem, quando assustado. O mundo clareia no imediato acorde, o um. Permanece pendurado em pautas e garranchos. Anseia descobrir segredos advindos de cantigas. Fica em calma.

É necessário cumprir uma tarefa. É preciso fazer um caminho. Uma machucadura precisa de cuidados. Homem vê sujeira à sua volta. Conhece sujidade em si. Percorre trechos e comete os erros. Recolhe-se, faminto, em cada noitada. Mastiga e mitiga o ego. Quer largar-se em mundo grande e viver entre os livres. Onde moram os livres?

Livra-se de venenos. Manda a esgotos fontes de alucinação. Quer clareza. O constrangimento é grande. Banha-se em água gelada. Veste-se. Calça-se. Coça-se. Vai às ruas cantarolar. Seu destino é nenhum. Deseja ver a cidade. Deseja percorrê-la sentado em bondes e em pernadas. Quer parceiros. Quer aprender a encontrar.

domingo, 6 de março de 2011

Passeio.

Há dias em repouso está Trump. Lio nem veio a sua procura. O silêncio entre os dois traz profundezas nos estudos musicais. Em súbito, decide sair. Ouve antes um som intenso. As vibrações advindas de uma orquestra perpassam momento. Quer espaço para guardar canções. Vai procurar em ruas e ventos. Vai a procura de ar.

O chuvisco sugere passeio de ônibus. Percorre sentado, escorado, pendurado, parado em intervalos, estações, terminais, um trecho, umas horas. Salta ainda com necessidade de muitos passos. Caminha festivo e solene. Retorna ao abrigo e canta. Dorme à margem da janela. Acorda muitas vezes. As nuvens transitam em veios de ventos fortes.

A terra treme em sonho – lembra-se. Cogita caminho. Cada entardecer anuncia. Sabe-se lá o que anuncia. Sabe-se lá. O fio do pensamento é infinito e percorre dimensões. Os pedaços da história, parcos, mal conseguem juntar-se. Homem em amores é tema difuso. Seres em contato é assunto a morar mais perto. Seguirei – exclama.

sábado, 5 de março de 2011

Salvar sábado.

Um pressuposto é a verdade, em seu existir qual verdade, a existir. A ação exigida aos homens é o encontro com outros. Escolher corpo, tribo e caminho é afazer eterno. Um poema é escrito em modo obtuso. Este é o escrito oculto de si. Escrevente ignora meandros. Desconhece fábula e fracassa. Não versos, blocos, são versos ou não?

É preciso estar em cuidados perenes. Não se pode parar. O amor exige recompensas. A música graceja em admoestação. Canta! Canta! Canta! Esperança do poeta cantador vem à tona. Memória é quarto escuro atraente. Movimentos precisam ser feitos. Rimar é assunto de afeto. Posta a passagem das horas, acontecimentos escapolem do entendimento.

Prevalece o dia em ameaça de noite. O claro é grande. Brilham ali e acolá lembrancinhas de dourado. O entorno forte é prata e negro. Há branco e profundos tons sem nome. O todo vai transtornado pelo giro terreno. Escurece a pouco e pouco. A ilusão do tempo é exibida. O homem decide-se pelo canto. Todos momentos findos, quando juntos, dão em infinito.

Vestido de noite.

Começa sem rumo. A prosa é tremenda. Na terceira via advém pausa. E é só a primeira. A noite importa. Sugere em chuvisco. Luzes há bastantes. Música é da boa. Tem a comida. Tem o abrigo. Tem dádivas tantas. Decidido vai homem. Vestido é de flores e estrelas. O fundo é preto. Chapéu encerra o japonês. Dança em gestos. O teatro é de sombras.

Maníaco salta a linha. Encerra trecho contido. Inaugura um tom acima. Logo canta um tanto. Come arroz estranho. A trilha vira Mestre Waltel. É pela Orquestra à Base de Sopro. Quem pode imaginar? Quem enxerga em olhos fechados? Quem pergunta? Quem conhece o som? Pensa nos homens lembradores das peças todas. Pensa. Teme o tremor. Teme o sentido.

Entre os escritos encontra um diário. Dele lê parte. Preparatório é qualquer dia. Homem atravessa décadas e cidades. O registro do íntimo é tarefa. É modo de conhecimento. As histórias não contadas ocupam espaço em memória. É necessário mandá-las para fora. Dar-se a conhecer é preciso. Qual é, homens dentro do homem, aquele a ser visto?

quarta-feira, 2 de março de 2011

Processo.

Começa sem título. É depoimento. Sempre é. A métrica nasce. É movimento. É encher. Nome é processo. Salta-se em transe. É pito. Momentâneo é. Viver-se é possível. Homem é.

Se é noite, prepara-se para delirar. Quem é o sonhador? Pode um leitor afoito perguntar. Pode um ouvinte ficar confuso. As circunstâncias tornam-se inexplicáveis. Há um convite.

Sob efeito é como está o homem. Está ligado a aparelhos. Seu delírio é percebido. As imagens de seu espírito alegre e atormentado são criptografadas. Há música elétrica.

Desiste de tudo a todo e cada instantâneo instante. Olha com ternura e respeito a todas e a cada uma das coisas sonhadas. Paredes deixar e sair a passeio é necessário. Vai!